Quando um homem examina os fatos como representante de um movimento
ou partido, ele não o faz desde sua posição de indivíduo humano
concreto, mas desde um papel social, que é em parte uma construção
abstrativa, em parte uma ficção. A veracidade ou falsidade da sua visão
não dependem das coisas em si mesmas, mas de uma ação posterior
destinada a modificá-las. O único tipo de veracidade que lhe é acessível
é o da profecia auto-realizável.
Por isso é perda de tempo investigar se as teses do marxismo são
"verdadeiras" ou "falsas", já que a relação aí existente entre as
afirmações e os fatos é sempre ambígua e reversível. Mesmo a falsidade
de uma profecia auto-realizável pode concorrer psicologicamente para a
sua realização.
Apesar de todas as suas pretensões científicas tão alardeadas, o
marxismo é cem por cento hostil a toda e qualquer noção de veracidade
objetiva. Gramsci e Ernesto Laclau entenderam isso perfeitamente.
Se não desisto de modificar o objeto enquanto o estou examinando,
nego-lhe todo estatuto de realidade objetiva e, em menor ou maior
medida, o reduzo a um efeito das minhas ações.
No fundo, o marxismo só se submete a um único critério de veracidade:
a vitória política, mesmo se obtida contra o sentido expresso das suas
próprias teses.
A desinformação não é um instrumento auxiliar do marxismo: é a própria natureza dele.
Uma pequena amostra do poder avassalador e permanente da influência
comunista na cultura do Ocidente é o fato de que tantos materiais de
propaganda postos em circulação nos anos 30 do século passado pela rede
multinacional de Willi Munzenberg continuem até hoje sendo divulgados
como grandes realizações artísticas e literárias, em detrimento de obras
incomparavelmente mais valiosas surgidas naquele período fora do
círculo munzenberguiano. Nos ambientes chiques de Nova York e Londres
você encontrará muito mais apreciadores dos desenhos de George Grosz e
Kathe Kollwitz, ou das peças de Bertolt Brecht, do que leitores dos
romances magistrais de Jacob Wassermann.
Todos os padrões estéticos dominantes até hoje entre o "beautiful
people" americano vieram de três fontes comunistas: a Bauhaus, Willi
Münzenberg e a New Left.
No começo dos anos 20 do século passado, o cineasta soviético Lev
Kuleschov fez um experimento que marcaria época: intercalou vários
close-ups frontais de um ator imóvel com várias imagens diferentes --
uma paisagem, um bicho, um prato de comida, uma criança sorrindo -- e
viu que isso despertava na platéia a impressão de uma performance
espetacular da parte de um ator que não fizera absolutamente nada. O
ilusionismo da "montagem" (editing) tornou-se o procedimento essencial do
cinema soviético, explorado especialmente pelo diretor Serguei
Eisenstein e pelas empresas cinematográficas de Willi Münzenberg para
dar a aparência de documentário realista a cenas totalmente inventadas.
Esse fenômeno revela uma das características mais fundas e constantes da
mentalidade comunista, que é a confusão permanente de realidade e
fantasia. Sem esse vício ou artifício, ninguém poderia cair no engodo de
um Partido cujo poder se assenta inteiramente no ardil de arrogar-se na
realidade presente a autoridade moral de um futuro hipotético que,
aliás, não pode chegar nunca, uma vez que, se chegasse, suprimiria
automaticamente essa autoridade, rebaixando o Partido, de juiz supremo, a
réu obrigado a prestar contas perante a contabilidade dos lucros e
prejuízos alcançados.
O de C
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