O único critério intelectual que vigora no Brasil é o futebolístico:
ou você está cem por cento no meu time, ou no time adversário. Não
existe meio torcedor, nem mero simpatizante. É tudo ou nada. Logo, se
você defende um caluniado, você é "partidário" dele, e se você cita um
livro, é devoto fanático do autor. Tal é o critério com que monstros de
imbecilidade como Arruinaldo Azevedo, Julio Severo e Rodrigo Constantino
interpretam o que escrevo. É de fazer um escritor perder o tesão de
escrever.
Karl Jaspers ensinava que TODA a inteligência está nas nuances.
Quando elas desaparecem, é o reino da estupidez e da barbárie (duas
palavras que os estúpidos e bárbaros, aliás, adoram repetir no vazio).
Mesmo neste país onde pessoas, idéias e instituições só podem ser
adoradas ou vilipendiadas em bloco, que é que me impede de, ao mesmo
tempo, admirar Giordano Bruno e achar que a Inquisição teve boas razões
para condená-lo à morte?
Dialética é admitir simultaneamente duas possibilidades
contraditórias, cada uma no seu devido plano. Entendo, por exemplo, que
em geral os UFOs são ilusões holográficas, mas com isso não nego "in
totum" a hipótese de existirem extraterrestres. No Brasil isso é
"incoerência".
Que é que me impede, exceto a burrice nacional, de achar, ao mesmo
tempo, que os militares teriam a obrigação moral de intervir e que uma
intervenção militar é inviável e inconveniente?
Qualquer pensamento dialético, por elementar que seja, está
INFINITAMENTE ACIMA das possibilidades de um Arruinaldo Azevedo, de um
Rodrigo Cocô Instantâneo ou de um Luciano Aymeuânus. Noventa e nove por
cento das indignaçõezinhas que eles ostentam como emblemas da sua
honestidade impoluta não passam de impotência dialética. O Cocô
Instantâneo ainda é perdoável, porque nunca esteve numa organização de
esquerda e só as conhece em imaginação. Mas o Aymeuanus e o Arruinaldo
não têm nem mesmo essa desculpa.
Na
própria esquerda, o último sujeito capaz de raciocínio dialético que
conheci no Brasil foi o Nabor Caires de Brito, nos anos 70 do século
passado. Depois vieram o marquês de Sader e similares, que descrevi no
"Imbecil Coletivo"; na geração seguinte o Ricardo Tamm-Tamm de Souza, o
Mauro Hic iacet, a Marcia Tiburon e dai para pior. O buraco não tem
fundo.
Muitas pessoas fazem questão de adorar ou abominar em bloco só para
dar a impressão de que personificam o bem contra o mal. Mas o bem e o
mal em sentido absoluto só existem na escala do Juizo Final, que por
enquanto é inacessível à nossa inteligência. No mundo em que estamos,
nem o Julio Severo é totalmente imprestável. Posso xingá-lo, mas não
condená-lo em bloco. Deixo a ele a incumbência das condenações totais
que só serão levadas à prática na cabeça dele mesmo.
O de C
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