Encontrar a própria voz, o próprio tom, é essencial na vida em geral,
mas na vida literária é PRIORIDADE UM. Encontrar, e não criar.
Vamos falar o português claro: na sociedade brasileira quase todo
mundo se sente fracassado, e com justa razão. A compensação mais
imediata, automática e desastrosa desse sentimento é o sujeito fingir
que é o que não é. Se você quer ser um escritor, tem de primeiro
aprender a falar com a voz do seu fracasso. Um pouco de autogozação
ajuda muito.
Os livros brasileiros seriam muito melhores se todos começassem com a frase: "Sou um bosta, mas..."
Um leitor precisa ser muito tapado para não perceber que, nos meus
escritos, os palavrões expressam apenas a recusa humilde de toda
solenidade fingida.
Não quero falar a ninguém num tom que eu não possa usar num botequim de favela.
É por isso que sou muito mais aceito pelo povão -- ou por grandes
escritores -- do que pela pseudo-elite da mídia e das universidades.
Falo para os de cima e para os de baixo. Os do meio que vão tomar no(s)
cu(s).
Ser um escritor é falar -- sempre -- de coração nas mãos.
Poses, trejeitos, afetações de polidez, teatralismos vários -- tudo tem de ser jogado na lata de lixo de uma vez para sempre.
Nos anos 50, todo mundo com ambições literárias sabia disso. A
destruição da cultura superior veio junto com a ascensão da falsa
polidez.
Naquela época, quem quer que dissesse que Graciliano Ramos, Jorge
Amado ou Nelson Rodrigues eram "bocas sujas" estava imediatamente
condenado ao ridículo.
Quando desaparece a literatura, desaparece logo em seguida a
população de leitores capacitados. Esse é talvez o maior problema
político do Brasil de hoje: você tem de educar o mesmo público que está
julgando o seu trabalho. Os retóricos romanos já sabiam que essa é a
situação de discurso mais temível e ameaçadora.
Tudo o que é necessário para você JAMAIS se tornar um escritor é
meter-se em discussões prematuras e, na ânsia de vencê-las, apelar aos
chavões mais usuais e correntes, cortejando a aprovação fácil da parte
mais preguiçosa da platéia. Escritores existem para banir os chavões e
preencher o lugar deles com linguagem viva. Entre ceder espaço a um
chavão e perder a afeição dos imbecis, um escritor preferirá SEMPRE esta
última alternativa.
Enquanto Lima Barreto afundava no isolamento que o levaria à
bebedeira e à loucura, o escritor mais celebrado pela mídia da época era
um tal de Pelino Guedes, que, obviamente, acabou desaparecendo no
esgoto da História. A mídia brasileira sempre foi o templo da
imbecilidade -- e, como o inglês da piada da vaca, não mudou nada.
O dia em que mais me senti realizado como escritor foi quando ouvi a
massa nos estádios gritando "Hei, Dilma, vá tomar no cu." Por um milhão
de vias sutis e não identificáveis, minha mensagem tinha chegado ao
povão. Semanas depois a turma saiu às ruas com os cartazes de "Olavo tem
razão", confirmando oficialmente o recebimento da mensagem. Outra
mensagem bem acolhida foi o apelo ao panelaço, que produziu sobre a
empáfia comunopetista os resultados mais devastadores -- na verdade, os
únicos resultados substantivos obtidos até agora. Que é que eu faço
quando vem algum Fábio Ostermann querendo me dar lições de política?
O de C
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