Quase toda relação social no Brasil é perniciosa, e aquela que se dá
no seio das igrejas não está excluída de modo algum. De que serve, por
exemplo, o sujeito dedicar-se à virtude, se por "virtude" ele entende
"ser como os outros gostariam que eu fosse"? Assim a virtude se torna
apenas mais um instrumento pelo qual o mundo (e seu príncipe) o
controla.
Poderíamos
fazer um glossário das virtudes cristo-brasileiras. "Paciência" é ser
conivente com as maldades alheias; "humildade" é esforçar-se para
persuadir todo mundo de que você não é melhor que eles; "vaidade" é
fazer uso das suas prerrogativas por méritos objetivos; etc.
Além das relações sociais, o Brasil sofre muito com o analfabetismo funcional e a pressa de julgar sem entender.
A
virtude não se mede como um "meio-termo", mas como adequação da atitude
ao seu objeto. Por exemplo, a humildade é uma atitude adequada ao valor
objetivo do sujeito. Você pode estar no meio-termo absoluto, e mesmo
assim não estar na virtude.
A
diferença entre coragem e temeridade não está na "quantidade de
virtude" (como se "coragem demais" fosse um vício), mas no objeto da
ação. Quanto mais virtude, melhor. A temeridade consiste numa caricatura
ou deformação da coragem, não em seu excesso. P.
ex., entregar-se ao perigo sem necessidade é temerário, e entregar-se
ao perigo por um bem superior é coragem. O objeto é que é diferente, não
a intensidade da virtude.
Perante
Deus, por exemplo, o valor objetivo de todo ser humano é minúsculo. Por
isso meditar sobre a grandeza de Deus torna os homens humildes.
Rafael Falcon
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