Nunca fui tímido por natureza, mas entre os vinte e os vinte e poucos
anos tive um período de timidez porque estava com todos os dentes
estragados, não tinha dinheiro para consertá-los, parecia um mendigo e
julgava que a coisa mais sensata a fazer com a minha cara era
escondê-la. Por isso compreendo perfeitamente o fenômeno da timidez Ela
tira você da corrente da vida e o espreme num canto escuro onde tudo só
acontece em pensamento e nada se realiza. Ela esmigalha oportunidades
como se fossem minhocas em que você pisa no caminho. Ela afasta você do
que você quer e povoa a sua vida de tudo o que você não quer. Da
timidez à depressão e da depressão ao ressentimento o caminho é bem
curto. Os tímidos estão entre os alimentos preferidos do diabo. Ele os
mastiga como chicletes e joga fora a borrachinha insossa que sobra no
fim. Se você tem a tentação da timidez, largue disso imediatamente.
Comece a fazer tudo o que você teme que vai cobri-lo de ridículo. É
melhor pagar mico do que ser um mico.
O Bullying destrói os tímidos mas estimula os caras-de-pau. Na escola
fui alvo de bullying porque, tendo ficado trancado num quarto de doente
por sete anos, era branco como um vampiro numa terra de gente morena.
Chegaram a me apelidar de Omo, o sabão em pó que, segundo o anúncio,
lava mais branco. Eu poderia até choramingar que fui vítima de racismo
inverso. Mas, recém-egresso do limbo, eu estava tão apaixonado pela vida
que tudo para mim era diversão. Retribuía piada com piada, gozação com
gozação, e no fim tudo ficava bem.
Só uma vez saí na porrada, não lembro o porquê. Mas o meu adversário acabou se tornando o meu melhor amigo.
Na escola conheci uma loirinha portuguesa que se tornou a minha
primeira paixão inviável, porque ela já tinha um namoradinho. Minha
segunda paixão, já no ginásio, foi uma neguinha linda chamada Ana Maria.
Quando fui à casa dela declarar o meu amor, a mãe dela me informou que
em dois ou três dias a família estava se mudando para outro Estado, e a
minha estréia no universo amoroso foi para as picas por impossibilidade
geográfica.
Minha terceira paixão foi a irmã de um amigo meu, a qual me agarrou
em baixo da escada e repentinamente me levou às estrelas. Ela era
justamente aquela com quem eu acreditava que jamais teria chance, pois,
grande e exuberante, vivia cercada de admiradores mais velhos perto dos
quais eu não passava de um pirralho.
Minha maior decepção amorosa foi uma morena maravilhosa. Era louca
por futebol, que eu detestava. A desgraçada me obrigou a assistir a uma
Copa do Mundo inteira, finda a qual a minha paixão tinha se
volatilizado.
O de C
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